A relação entre os resultados de eleições legislativas e os resultados das europeias subsequentes costuma depender, em grande medida, do momento em que as segundas ocorrem. Quando têm lugar a meio do ciclo eleitoral nacional, as eleições europeias costumam devolver resultados bastante diferentes dos das legislativas. Os partidos de Governo são geralmente punidos ao passo que os pequenos partidos melhoram o seu desempenho. Contudo, em Portugal, as eleições de 2024 para o Parlamento Europeu ocorreram apenas três meses depois das legislativas. Isso ajuda a explicar a relativa semelhança entre a distribuição dos votos nas duas eleições: PS e AD continuaram com resultados próximos dos 30%; BE, CDU e Livre ficaram-se por valores em torno dos 4%.
Há duas exceções a esta continuidade: a subida da IL e a queda do Chega. É muito possível que o perfil e o desempenho dos cabeças de lista de cada um dos partidos tenham feito diferença, em sentidos opostos. De resto, os 360 mil votos da IL nestas europeias, mais 40 mil que nas últimas legislativas, mas numa eleição com pouco mais de metade da participação eleitoral, fazem ponderar um contrafactual: que resultado poderia a IL ter obtido nas legislativas com Cotrim na sua liderança? Mas independentemente disso, outra maneira de pensar nesta variação consiste em olhar para as bases sociais de ambos os partidos e como se (des)mobilizaram para estas eleições. A IL é muito mais forte entre os eleitores com o ensino superior do que entre os restantes, e um fenómeno simétrico (se bem que menos acentuado) ocorre com o Chega. Sendo verdade que quem tem maiores recursos educacionais participa mais em todas as eleições, as que se caracterizam por alta abstenção, como estas europeias, tendem a agudizar essa assimetria. Nas legislativas, cerca de um em cada três votantes tinha o ensino superior. Nas últimas europeias, praticamente metade dos que votaram tinham completado esse nível de instrução. Isto facilitou a vida à IL, dificultando-a para o Chega.
Quanto ao resto, os padrões já detetados em eleições anteriores mantiveram-se nestas europeias. São quatro. Primeiro, a tendência das mulheres a votarem mais à esquerda, através da maior feminização dos eleitorados do PS e (especialmente) do BE e da tendência oposta nos eleitorados da IL e (especialmente) do Chega.
Segundo, a emergência de uma clara clivagem etária entre os eleitores, especialmente marcada no contraste entre, por um lado, o PS e a CDU e, por outro, a IL, o Livre e (em menor grau) o Chega e o BE. O PSD, tal como já tinha sucedido nas legislativas, é o único partido “histórico” que ainda consegue manter um desempenho junto dos mais jovens não muito distante do que obtém junto da generalidade dos eleitores. Já o PS terá recebido apenas 15% dos votos entre os que participaram nas europeias com idades entre os 18 e os 34 anos, menos de metade do seu resultado geral no Continente.
O terceiro padrão que se manteve foi o da já mencionada relação entre instrução e opção de voto: de um lado, AD, IL, BE e Livre mais fortes entre os mais instruídos; do outro, a esquerda “tradicional” (PS e CDU) e o Chega.
Finalmente, confirma-se outra regularidade: aparentemente, muitos votantes decidem tarde o seu sentido de voto. Tal como sucedeu nas legislativas de 2024, 21% dos que votaram nas europeias disseram, nas sondagens à boca das urnas, terem decidido o seu sentido de voto na última semana antes das eleições, valor que sobe para mais de 30% entre os mais jovens. Quem insiste em encarar as sondagens pré-eleitorais como previsões do que possa suceder no dia da eleição vai continuar a arriscar desilusões.