Na noite eleitoral, a maioria absoluta do PS foi uma surpresa para muitos. Daí que a sondagem pós-eleitoral que hoje é divulgada pelo Expresso seja importante para perceber as mudanças no voto, e como ocorreram. Com uma questão prévia: a campanha eleitoral foi decisiva?
Existe um debate académico sobre o efeito das campanhas eleitorais. Muitos estudos, realizados sobretudo nos EUA, são céticos em relação à sua importância, tendendo a concluir que os efeitos são mínimos. Tudo o que os eleitores veem, ouvem e leem é interpretado à luz das suas convicções partidárias prévias, e por isso não mudam as suas escolhas políticas. Outros estudos mostram que os media podem influenciar os temas que são relevantes numa campanha, o que, por sua vez, tem impacto nas escolhas partidárias. As campanhas podem ainda contribuir para a mudança política devido à exposição que dão a candidatos e partidos relativamente desconhecidos.
A sondagem mostra que globalmente os portugueses não estão muito informados sobre política e não deram atenção às sondagens. Mas a campanha eleitoral foi importante por dois motivos. Primeiro, os votantes de última hora inclinaram-se sobretudo para o PS; segundo, os pequenos partidos de direita ganharam a maioria dos seus votos no decorrer da campanha.
A sondagem mostra que 14% dos inquiridos decidiram o seu sentido de voto no próprio dia. Este é o valor mais alto desde 2002, primeira vez que colocámos esta questão. Destes, cerca de um terço optou pelo PS — de longe o partido mais escolhido no próprio dia das eleições.
Os últimos dias de campanha eleitoral parecem ter contribuído para esta reta final a favor do PS. Estes votantes podem também explicar uma parte da diferença entre os resultados das sondagens, que poucos dias antes indicavam uma maior proximidade entre PS e PSD, e a maioria absoluta obtida pelo PS.
As transferências de votos de 2019 para 2022 sugerem que o PSD conseguiu mobilizar abstencionistas, mas perdeu votos à sua direita, sobretudo para a IL e o Chega. A maioria dos votantes da IL e do Chega afirmam ter decidido o seu voto durante a campanha eleitoral, o que de novo sugere a importância desta para o resultado das eleições.
Mais do que a importância da campanha, esta sondagem sobre as eleições de 2022 mostra a fluidez do eleitorado português.
A forte identificação partidária, que limita os efeitos das campanhas num sistema bipartidário como os EUA, na Europa das democracias multipartidárias é representada pela identificação ideológica, levando a uma maior fluidez na escolha partidária dos votantes dentro do seu bloco ideológico, a esquerda ou a direita.
À esquerda, a fluidez favoreceu o PS, que ganhou votantes ao BE e em menor grau à CDU; enquanto à direita o PSD perdeu para os pequenos partidos à sua direita.
Nesta fluidez, a abstenção em Portugal joga um papel central. Tanto o PS como o PSD mobilizaram muitos votantes que se tinham abstido em 2019, mas o partido com maior percentagem de votos de quem se absteve em 2019 foi o Chega.